Esta semana um texto me chamou muita atenção. Em meio a tantas especulações a cerca da falta de segurança na boate Kiss, encontro esta reflexão indignada do arquiteto sobre a tragédia em Santa Maria. Vale a pena pensar sobre isso… (Por Rodrigo Klassmann Daudt)
Quando assisto uma cobertura de um desastre aéreo, fico lá, prestando atenção em toda aquela informação e sempre me pergunto, na condição de leigo, até que ponto as pessoas que ali estão, ao vivo, dominam o assunto sobre o qual debatem… O especialista normalmente domina. Só ele. E daí decorre debates que ao invés de informar, mais atrapalham do que ajudam.
Bom, agora é diferente… Saio da condição de leigo. E imagino que caiba a mim e aos meus colegas arquitetos e engenheiros, informar corretamente os que agora continuam na condição de leigo. Aí está ela: NBR 9077. Absolutamente criteriosa. Complexa. Não vou usar o termo “de primeiro mundo”. Sei que ela está entre as mais seguras em vigor no planeta. Portanto, que se diga tudo nesta hora, menos que a legislação brasileira é ineficiente. Não digam que as normas precisam ser revistas. Chega de bobagens. Chega de por a culpa nos papéis. Os papéis estão aí e, neste caso, são praticamente motivo de orgulho. Escutei hoje pela manhã a uma vergonhosa entrevista do prefeito de Santa Maria. Esquivou-se de qualquer responsabilidade. Sugeriu revisão das normas. O que é isso? Uma norma mais rígida que a 9077 eu não consigo imaginar… Aplicamos a 9077 diariamente a tudo que é projetado neste país e lhes digo: ela não está aí pra brincadeira não. Ela é perfeita? Claro que não, mas não venham pedir revisão das normas. Não na minha frente. Sabe o que matou estes 300 e tantos jovens? O jeitinho brasileiro. A malandragem. A ginga. O jeito maneiro… A saída que é mostrada na vistoria dos bombeiros e lacrada no dia seguinte. A informação de capacidades de lotação muito inferior à praticada. A influência política nos licenciamentos. Sim, donos de casa noturna são normalmente empresários bem sucedidos… Sempre dá-se um jeito para alguém influente. Sempre se alivia… Pois como se diz por aqui: não vai dar nada… Agora deu. E vai dar de novo, pois a Kiss não era exceção. Portanto, diante da tragédia, só tenho uma contribuição: não culpem a NBR 9077. Culpem os brasileiros em geral. Principalmente os malandros. Principalmente aqueles hipócritas, que agora pedem a plenos pulmões que as leis sejam cumpridas, enquanto desfilam em seus carros falando ao celular…”
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A norma está aí. Realmente o que acontece é que as autoridades ou quem quer que seja que a usem querem burlar, maquiar, ou simplismente preencher papel… enfim, o resto não tem o que discutir.
O problema não são as normas, mas sim os excesso de fiscais, a corrupção e a certeza da impunidade de não se obedecer as regras da lei.
Regra da lei é condição essencial para o desenvolvimento da inovação. Para haver confiança, um sistema judiciário que faça valer as regras da lei, é imprescindível, mas aqui no Brasil, infelizmente quem transgride a lei só é punido se for pobre, preto ou puta. Também podem ser punidos uns poucos íntegros e honestos que não são coniventes e tem coragem de denunciar falcatruas, já que a regra geral por aqui é, roubar pode, mas denunciar o ladrão, jamais. Fato que também não deixa de ser mais uma lamentável inversão de princípios e valores.
Como queremos que o mundo confie em nós se não temos sequer um sistema judicial atuante e justo que é parte essencial do processo? O mundo somente irá confiar em nós quando conseguirmos provar que somos um povo confiável, pois confiar é o primeiro mandamento para quem quer se desenvolver, pois confiança e detecção e punição da injustiça estão no coração da sociedade, no centro da idéia de civilização. Ninguém se arrisca a comerciar ou negociar com quem não é confiável. A percepção de reciprocidade-justiça-confiança é o eixo central em qualquer comunidade inovadora.
A percepção de que “as coisas são injustas em nosso país” está corroendo e travando tudo por aqui, pois numa sociedade onde os não cooperadores ultrapassam os cooperadores, a colaboração não se sustenta mais no nível necessário para produzir riquezas e o país fatalmente caminhará para o subdesenvolvimento eterno.
Aí está a razão pela qual países inovadores prezam tanto pela chamada “regra da lei”, pois é ela que garante que a camarilha de aproveitadores, corruptos, ladrões “o pessoal soma zero”, seja contido, e não consiga contaminar a sociedade como um todo.