Em 2024, a ISO 9001 veio com uma emenda que, apesar de curtíssima, modifica todo o cenário organizacional das empresas que têm o SGQ certificado.
Em uma frase, a ISO 9001 traz especificado no bojo da seção 4 – que trabalha o contexto organizacional, partes interessadas, escopo e processos do SGQ – que as organizações precisam:
- Determinar se mudanças climáticas são uma questão relevante e
- Se partes interessadas relevantes podem ter requisitos relacionados a mudanças climáticas.
Trata-se, em uma visão mais abrangente, do que se subentende sob o termo “sustentabilidade”. Fato é que a norma nomeia, com todas as palavras, que espera que as empresas tenham projetos com impactos reais por trás do hype e dos discursos sobre a sustentabilidade ambiental.
Dito isso, a pergunta que todos os profissionais da qualidade estão se fazendo é: como?
Muitas empresas não sabem por onde começar, o que devem incluir e nem muito menos como reportar seu desempenho na tratativa de questões ligadas a impactos climáticos e sustentabilidade em geral.
A matriz de materialidade tem sido a ferramenta de que as empresas mais têm se apropriado com esse fim em vista. Segundo a KPMG, 80% das 250 maiores empresas do mundo a usam.
Neste artigo, você tem insumos para dar os passos iniciais com essa ferramenta, para usá-la seja se adequar à emenda 01/2024 da ISO 9001, seja no desdobramento de uma agenda robusta e completa em ESG.
O que é matriz de materialidade?
“Materialidade” é um termo oriundo do mundo financeiro e, segundo reportagem da Forbes.,“é definido, essencialmente, como informação que pode influenciar e, em última instância, informar decisões financeiras de uma instituição”.
A partir dessa origem, a matriz de materialidade é uma definição das questões de sustentabilidade ou ESG que importam ser priorizadas para um negócio e suas partes interessadas – precisamente o que a ISO 9001 pede na emenda 01/2024.
Essa abordagem pode ser dupla: tanto no sentido de efeitos de mudanças climáticas que a organização pode sofrer quanto de impactos climáticos que ela pode causar. Nesse caso, teremos uma matriz dupla de materialidade.
Independentemente de ser simples ou dupla, a matriz de materialidade sempre será uma visão holística. Ela deseja dar conta de todos (ou da maioria) dos tópicos ligados a sustentabilidade e ESG relacionados à organização.
Por essas características, segundo artigo da KPMG, a matriz de materialidade deve ser vista como uma ferramenta estratégica que oportuniza a aplicação de uma lente de sustentabilidade aos processos de gestão de riscos e oportunidades.
O que esperar de uma matriz de materialidade
Ao conduzir uma matriz de materialidade, a organização assegura mas também direciona a tratativa de questões ligadas e sustentabilidade e ESG, dentro do planejamento estratégico e de seus investimentos.
Mais que isso, ao se dedicar a esse levantamento, a empresa oportuniza a identificação de tendências, podendo se preparar seja para mitigá-las no caso de riscos, seja para aproveitá-las no caso de oportunidades.
Como fazer uma matriz de materialidade?
Há vários guias de diferentes grandes consultorias – a exemplo de KPMG, Forrester, PwC e Deloitte – ensinando a fazer uma matriz de materialidade.
Aqui, trazemos uma síntese de 5 passos que busca um caminho comum a essas abordagens:
1. Compreender propósito, escopo e requisitos atuais e do futuro
Desenho do contexto e momento organizacional, assim como stakeholders, com vistas a:
- Definição do que significa materialidade para a organização
- Conscientização e adesão ao projeto
- Engajamento a nível executivo
- Definição de propósito
- Determinação da abordagem.
2. Identificar e registrar tópicos potencialmente materiais
Mapeamento de tópicos relevantes, análise inicial de seus impactos e consolidação da lista.
3. Avaliar tópicos identificados, categorizar e validar resultados
Aprofundamento na análise, com:
- Coleta de contribuições de stakeholders
- Relevância para a organização
- Análise de impacto financeiro e não financeiro
- Refinamento da lista e agrupamento por afinidades.
4. Priorização
Cotejamento dos tópicos materiais levantados com a estratégia e outros requisitos dos stakeholders a fim de priorizar.
5. Gerenciar, conduzir e atualizar tópicos materiais
Acompanhamento dos tópicos materiais, insights para conduzir a tomada de decisão, feedback de stakeholders, garantindo que a matriz de materialidade seja de fato incorporada pela organização.
10 boas práticas na construção de uma matriz de materialidade
A Deloitte recomenda as seguintes práticas para o desenvolvimento de matrizes de materialidade:
- Definição de um patrocinador da alta direção para ser dono do projeto.
- Vinculação da matriz de materialidade ao planejamento estratégico, como uma entrada a definição de projetos, investimentos, aquisições, fusões, definição de portfólio e outras.
- Determinação de estruturas de governança para os processos de materialidade.
- Mapeamento de impactos de dentro para fora e, depois, de fora para dentro.
- Alinhamento a objetivos financeiros e não financeiros.
- Coordenação de esforços de atuação sobre questões materiais.
- Atualização contínua da matriz de materialidade.
- Integração dos tópicos materiais nos sistemas de gestão da organização.
- Desenho de relatórios de feedback sobre projetos, para comunicação com stakeholders.
- Faça benchmarkings com parceiros e outros pares no mercado.
Limitações da ferramenta
Uma limitação bem documentada sobre a matriz de materialidade é a falta de dados, que acaba levando a avaliações rasas e enviesadas, que não refletem a compreensão e análise dos riscos, impactos e oportunidades na cadeia.
A contraparte dessa limitação é uma abordagem complexa demais, em que tudo é importante, sem a devida contextualização e conexão com o negócio.
Ambos os fatores levam à falta de transparência na escolha de tópicos e projetos e, pior que isso, à incapacidade de agir, isolando os tópicos materiais do resto do negócio.
A ação sobre as questões materiais não está engendrada na matriz, de modo que essa ponte precisa ser criada.
Outro ponto relacionado ao primeiro é a falta de dinamicidade das matrizes de materialidade. Elas precisam ser revisitadas de tempos em tempos e atualizadas sempre que necessário ou oportuno, a fim de captarem tópicos emergentes.
Adeque o SGQ à emenda 01/2024 com a matriz de materialidade
A matriz de materialidade é uma ferramenta que – a exemplo do que já vêm fazendo grandes empresas – pode ser adotada pela organização a nível estratégico para responder, em um sentido mais restrito, às novas exigências da ISO 9001 e, em um sentido mais amplo, a uma agenda ESG.
Sua simplicidade conceitual e metodológica, no entanto, não pode levar a um uso superficial da ferramenta pela organização.
Conte com apoio para o desenho e uso de sua primeira matriz de materialidade.